Dilma Presidenta - Em nome da verdade

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

LULA e o valor dos Blogs sujos... o PIG(*) que se cuide!

Entrevista do Presidente Lula à blogsfera



(*) Segundo Paulo Henrique Amorim: "Em nenhuma democracia séria do mundo, jornais conservadores, de baixa qualidade técnica e até sensacionalistas, e uma única rede de televisão têm a importância que têm no Brasil. Eles se transformaram num partido político – o PiG, Partido da Imprensa Golpista".

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

"A guerra se deu entre o preconceito e a verdadeira informação"

Em entrevista à Carta Maior, Marilena Chauí avalia a guerra eleitoral travada na disputa presidencial e chama a atenção para a dificuldade que a oposição teve em manter um alvo único na criação da imagem de Dilma Rousseff: "o preconceito começou com a guerrilheira, não deu certo; passou, então, para a administradora sem experiência política, não deu certo; passou para a afilhada de Lula, não deu certo; desembestou na fúria anti-aborto, e não deu certo. E não deu certo porque a população dispõe dos fatos concretos resultantes das políticas do governo Lula". Para a professora de Filosofia da USP, essa foi a novidade mais instigante da eleição: a guerra se deu entre o preconceito e a verdadeira informação. E esta última venceu.
CARTA MAIOR: Qual sua avaliação sobre a cobertura da chamada grande mídia brasileira nas eleições deste ano? Na sua opinião, houve alguma surpresa ou novidade em relação à eleição anterior?

MARILENA CHAUÍ: Eu diria que, desta vez, o cerco foi mais intenso, assumindo tons de guerra, mais do que mera polarização de opiniões políticas. Mas não foi surpresa: se considerarmos que 92% da população aprovam o governo Lula como ótimo e bom, 4% o consideram regular, restam 4% de desaprovação a qual está concentrada nos meios de comunicação. São as empresas e seus empregados que representam esses 4% e são eles quem têm o poder de fogo para a guerra.

O interessante foi a dificuldade para manter um alvo único na criação da imagem de Dilma Rousseff: o preconceito começou com a guerrilheira, não deu certo; passou, então, para a administradora sem experiência política, não deu certo; passou, então, para a afilhada de Lula, não deu certo; desembestou na fúria anti-aborto, e não deu certo. E não deu certo porque a população dispõe dos fatos concretos resultantes das políticas do governo Lula.

Isso me parece a novidade mais instigante, isto é, uma sociedade diretamente informada pelas ações governamentais que mudaram seu modo de vida e suas perspectivas, de maneira que a guerra se deu entre o preconceito e a verdadeira informação.

CM: Passada a eleição, um dos debates que deve marcar o próximo período diz respeito à regulamentação do setor de comunicação. Como se sabe, a resistência das grandes empresas de mídia é muito forte. Como superar essa resistência?

MC: Numa democracia, o direito à informação é essencial. Tanto o direito de produzir e difundir informação como o direito de receber e ter acesso à informação. Isso se chama isegoria, palavra criada pelos inventores da democracia, os gregos, significando o direito emitir em público uma opinião para ser discutida e votada, assim como o direito de receber uma opinião para avaliá-la, aceitá-la ou rejeitá-la.

Justamente por isso, em todos os países democráticos, existe regulamentação do setor de comunicação. Essa regulamentação visa assegurar a isegoria, a liberdade de expressão e o direito ao contraditório, além de diminuir, tanto quanto possível, o monopólio da informação.

Evidentemente, hoje essa regulamentação encontra dificuldades postas pela estrutura oligopólica dos meios, controlados globalmente por um pequeno número de empresas transnacionais. Mas não é por ser difícil, que a regulamentação não deve ser estabelecida e defendida. Trata-se da batalha moderna entre o público e o privado.

CM: Você concorda com a seguinte afirmação: "A mídia brasileira é uma das mais autoritárias do mundo".

MC: Se deixarmos de lado o caso óbvio das ditaduras e considerarmos apenas as repúblicas democráticas, concordo.

CM: Na sua opinião, é possível fazer alguma distinção entre os grandes veículos midiáticos, do ponto de vista de sua orientação editorial? Ou o que predomina é um pensamento único mesmo.

MC: As variações se dão no interior do pensamento único, isto é, da hegemonia pós-moderna e neoliberal. Ou seja, há setores reacionários de extrema direita, setores claramente conservadores e setores que usam “a folha de parreira”. A folha de parreira, segundo a lenda, serviu para Adão e Eva se cobrirem quando descobriram que estavam nus.

Na mídia, a “folha de parreira” consiste em dar um pequeno e controlado espaço à opinião divergente ou contrária à linha da empresa. Às vezes, não dá certo. O caso do Estadão contra Maria Rita Kehl mostra que uma vigorosa voz destoante no coral do “sim senhor” não pode ser suportada.

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Qual será a manchete da Folha?


por Mair Pena Neto, em Direto da Redação

Qual será a manchete da Folha de S.Paulo quando tiver acesso aos autos do processo da ditadura contra a presidente eleita Dilma Rousseff, garantido pelos ministros do Superior Tribunal Militar? “Dilma participou do assalto a cofre de Ademar de Barros”, “Dilma tomou parte de assalto a banco que resultou na morte de inocentes”, “Dilma delatou companheiros”?
Qualquer que seja a escolha do jornal paulista diante do que poderá constar no processo, qual será a intenção de publicá-la? Fiz a mesma pergunta aqui neste espaço, antes do segundo turno das eleições presidenciais, quando estava evidente o objetivo da Folha de tentar interferir na votação de 31 de outubro com algum fato que pudesse macular a imagem da então candidata. E a repito agora, com Dilma eleita, para tentar compreender até onde está disposto a ir o jornal na sanha de deslegitimar a candidata escolhida pela maioria do povo brasileiro.
Não há nenhum problema em recuperar o passado de pessoas públicas, mesmo que este as denigra, desde que baseado em fatos e fontes confiáveis. Apresentar o papa Bento 16 como ex-integrante da juventude nazista, por exemplo, é indiscutível, pois imagens e registros atestados historicamente o comprovam. Isso não impede que os católicos o reconheçam como líder máximo da sua Igreja, contextualizando o ocorrido no tempo e no espaço.
O problema no caso de Dilma é que a Folha parece afoita em dar vazão a registros que foram obtidos em circunstâncias excepcionais. Dilma não compareceu a uma delegacia para prestar esclarecimentos, acompanhada de seu advogado, e nem respondeu a um processo legítimo. Muito do que consta nos autos de seu processo provavelmente foi obtido enquanto estava pendurada num pau de arara ou sentada na cadeira do dragão sendo barbaramente torturada.
Uma publicação jornalística com o mínimo de seriedade teria que levar isso em conta e não reproduzir simplesmente o que diz um processo suspeito, produzido por um governo que rompeu a ordem constitucional do país e adotou a tortura como instrumento de obter confissões, contrariando os princípios mais básicos dos direitos humanos. Foi esta conduta que os jornais adotaram quando a ditadura tentou apresentar a morte do jornalista Vladmir Herzog como suicídio. Ninguém, talvez com exceção da empresa que publica a Folha, aceitou a versão como verdade. O que provinha da ditadura não era confiável sob nenhuma hipótese.
Confissões sob tortura não têm valor jurídico. E reproduzi-las pura e simplesmente, escudando-se no fato de se tratarem de documentos oficiais, seria de uma leviandade ímpar. Outro agravante de tal divulgação seria legitimar a ditadura militar, um dos períodos mais cruéis e trágicos da história brasileira, confiando exclusivamente na veracidade dos documentos que produziu. O Brasil ainda não fechou a página do que se passou naqueles 25 anos para aceitar passivamente fatos originados nos porões do regime.
Não espero que a Folha não o faça. O jornal publicou coisa muito pior, como a ficha falsa de Dilma antes mesmo de a campanha começar. Talvez seja até uma tentativa de encontrar algo que repare a “barriga” do jornal ao publicar, sem nenhum critério de verificação, a tal ficha, proveniente de um site de ultradireita. Ou então, iniciar um terceiro turno, apresentando as armas para o combate sem tréguas que desempenhará nos próximos quatro anos.
Seja qual for o propósito, ele parece tudo, menos jornalístico. O empenho do jornal se coaduna muito mais com os seus próprios interesses do que com os interesses do país. Seja lá o que contiverem os autos, a sua publicação servirá, sobretudo, para diminuir ainda mais o tamanho da Folha de S.Paulo, que já saiu bem reduzida da recente eleição.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

A mídia e a agenda do novo governo

Por Gilberto Maringoni (*)

Ninguém quer tolher a livre circulação de informações e impor a censura. A não ser a grande mídia brasileira, que tenta a todo custo, sufocar e colocar uma mordaça esse saudável debate que não tem como ser interrompido.
Muito mais do que a candidatura José Serra e sua coalizão demotucana, a derrotada destas eleições foi a grande mídia. Ou o verdadeiro partido de oposição no Brasil. Não falamos aqui de intrincados conceitos gramscianos, mas das reflexões de Judith Brito, presidente da Associação Nacional dos Jornais (ANJ). Segundo ela, à falta de uma oposição estruturada no país, a imprensa deve cumprir tal papel. Não é à toa que sustentou José Serra desde o primeiro momento.

Pois a mídia brasileira, mesmo derrotada, não passa recibo. Já está de armas e bagagens empenhada no terceiro turno: a definição da agenda do governo Dilma.

Logo no domingo à noite, mal anunciados os resultados eleitorais, comentaristas revezavam-se diante de câmeras e microfones para alertar o país sobre a necessidade de um duro ajuste fiscal, de uma reforma da Previdência, de restrições a reajustes salariais e de redução da “gastança” governamental. Um saco de maldades estaria à caminho.

Iniciativa perdida

A imprensa brasileira tenta retomar a iniciativa política, perdida nos últimos anos. Apostou contra os interesses nacionais nos enfrentamentos que o Brasil teve na política externa, tentou desmoralizar o presidente da República e demonizar demandas populares. Ela está no seu direito. A novidade é que agora a mídia enfrenta não apenas uma disseminação infindável de pequenos concorrentes pela internet, mas uma repulsa nacional às diretrizes liberais e privatistas que apoiou em tempos recentes.

A imprensa é personagem das disputas políticas. Mais importante do que “fazer a cabeça das pessoas”, ela busca apontar os assuntos sobre os quais as pessoas devem pensar. Essa é a base da Teoria do Agendamento – ou “Agenda setting”, em bom português – formulada nos anos 1970 por dois pesquisadores norteamericanos, Maxwell Mc Combs e Donald Shaw. Funciona mais ou menos assim: uma hora é o mensalão, outra é o suposto caso do vazamento de dados, mais adiante são as polêmicas religiosas e por aí vai. São firulas do varejo político pré eleitoral. O que faziam anteriormente era estabelecer as normas do grande debate de rumos para o país.

O mecanismo funcionou bem até 2006. No primeiro mandato de Lula, com a inestimável colaboração de setores ultraliberais do governo, representados pelos ministros Antonio Palocci, Paulo Bernardo e pelo presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, a mídia e os setores por ela articulados impuseram uma grande pauta continuísta. Com a situação de desarranjo geral na economia, legado pelo governo FHC, os meios de comunicação viram suas diretrizes vencerem ao longo de quase todo o primeiro quadriênio petista, a ponto de o ajuste fiscal realizado em 2003 ter sido o mais duro desde 1990.

Após a crise política de 2005 e com uma evidente melhoria no quadro internacional, dois postos-chave da administração pública foram mudados, a Fazenda e a Casa Civil. Assumiram suas cadeiras Guido Mantega e Dilma Rousseff. Aos poucos saiu de cena a pauta liberal e tomou corpo uma orientação desenvolvimentista, cujo primeiro esboço foram os maciços investimentos estatais sintetizados na primeira versão do PAC. Uma nova agenda então se consolidou, a do desenvolvimento.

Quem dá o tom

Agendas políticas não são estipuladas apenas pelos governos, mas fazem parte da disputa pela hegemonia na sociedade. Impõe agenda quem tem força e iniciativa política.

Assim, a pauta do início dos anos 1980 não foi obra da ditadura, que vivia seus estertores. A orientação democrática tomou corpo de fora para dentro do governo, pelos partidos de oposição e pelos movimentos sociais, que exigiam o fim do regime de exceção. Da mesma forma, na segunda metade daquela década, a discussão central tinha como eixo norteador a questão do Estado.

Os embates oriundos da sociedade se cristalizaram na Assembleia Constituinte, em 1988, após acirradas contendas realizadas na fase terminal dos governos militares e no epílogo do longo ciclo desenvolvimentista, observado entre 1930 e 1980.

A partir de 1990, com as vitórias de Fernando Collor e de Fernando Henrique, a agenda foi imposta a partir de cima. Com um país traumatizado por quase uma década de inflação descontrolada, a estabilidade ganhou o centro do palco, tendo como decorrência uma redefinição do papel do Estado, via privatizações e financeirização da economia.

A história posterior é conhecida. O modelo liberal se esgotou em 2005.

O desenvolvimentismo destes últimos cinco anos foi marcado por uma forte característica social. Na maior parte da América do Sul se deu algo semelhante. A erradicação da pobreza ganhou relevância.

Nova década

Qual seria uma agenda viável para esta nova década, que fortaleceria a organização da sociedade e suplantaria os interesses das elites, vocalizadas pela mídia?

Há várias. Um ponto parece ter maioria na coalizão da presidenta Dilma Rousseff: o desenvolvimento continua. Mas há um fator que precisa também estar no centro dos debates: o papel das comunicações em nossa sociedade.

A pergunta é: há possibilidade de o Brasil construir um projeto nacional e democrático de desenvolvimento com uma indústria midiática antidemocrática, elitista, excludente e monopolizada, que tenta se legitimar como esfera pública e lócus essencial da definição de rumos para o país?

As entidades populares, os partidos democráticos e incontáveis ativistas sociais já têm um ponto de partida para entrarem nessa conversa. Trata-se das resoluções da I Conferência Nacional de Comunicação, realizada em dezembro de 2009. Um tento histórico! Algumas das bandeiras lá definidas começam a se tornar realidade. Assembleias Legislativas de vários estados começam a construir Conselhos Estaduais de Comunicação. O governo Lula deu início ao Plano Nacional de Banda Larga para fazer frente à falta de investimentos das empresas privadas do setor. O IPEA realizará, no final de novembro, em Brasília, a Conferência do Desenvolvimento, na qual o tema comunicação terá espaço destacado (ver em www.ipea.gov.br).

Ninguém quer tolher a livre circulação de informações e impor a censura. A não ser a grande mídia brasileira, que tenta a todo custo, sufocar e colocar uma mordaça esse saudável debate que não tem como ser interrompido.

(*) Gilberto Maringoni, jornalista e cartunista, é doutor em História pela Universidade de São Paulo (USP) e autor de “A Venezuela que se inventa – poder, petróleo e intriga nos tempos de Chávez” (Editora Fundação Perseu Abramo).

domingo, 7 de novembro de 2010

Civilização ou barbárie

Por Emir Sader

Esse é o lema predominante no capitalismo contemporâneo. Universalizado a partir da Europa ocidental, o capitalismo desqualificou a todas outras civilizações como ‘bárbaras”. A ponto que, como denuncia em um livro fundamental, Orientalismo, Edward Said, o Ocidente forjou uma noção de Oriente, que amalgama tudo o que não é Ocidente: mundo árabe, japonês, chinês, indiano, africano, etc. etc. Fizeram Ocidente sinônimo de civilização e Oriente, o resto, idêntico a barbárie.

No cinema, na literatura, nos discursos, civilização é identificada com a civilização da Europa ocidental – a que se acrescentou a dos EUA posteriormente. Brancos, cristãos, anglo-saxões, protestantes – sinônimo de civilizados. Foram o eixo da colonização da periferia, a quem queriam trazer sua “civilização”. Foram colonizadores e imperialistas.

Os EUA se encarregaram de globalizar a visão racista do mundo, através de Hollywood. Os filmes de far west contavam como gesto de civilização as campanhas de extermínio das populações nativas nos EUA, em que o cow boy era chamado de “mocinho” e, automaticamente, os indígenas eram “bandidos, gestos que tiveram em John Wayne o “americano indômito”, na realidade a expressão do massacre das populações originárias.

Os filmes de guerra foram sempre contra outras etnias: asiáticos, árabes, negros, latinos. O país que protagonizou o mais massacre do século passado – a Alemanha nazista -, com o holocausto de judeus, comunistas, ciganos, foi sempre poupada pelos nortemamericanos, porque são iguais a eles – brancos, anglo-saxões, capitalistas, protestantes. O único grande filme sobre o nazismo foi feito pelo britânico Charles Chaplin – O grande ditador -, que teve que sair dos EUA antes mesmo do filme estrear, pelo clima insuportável que criaram contra ele.

Os países que supostamente encarnavam a “civilização” se engalfinharam nas duas guerras mundiais do século XX, pela repartição das colônias – do mundo bárbaro – entre si, em selvagens guerras interimperialistas.

Essa ideologia foi importada pela direita paulista, aquela que se expressou no “A questão social é questão de polícia”, do Washington Luis – como o FHC, carioca importado pela elite paulista -, derrubada pelo Getúlio e que passou a representar o anti-getulismo na politica brasileira. Tentaram retomar o poder em 1932 – como bem caracterizou o Lula, nada de revolução, um golpe, uma tentativa de contrarrevolução -, perderam e foram sucessivamente derrotados nas eleições de 1945, 1950, 1955. Quando ganharam, foi apelando para uma figura caricata de moralista, Jânio, que não durou meses na presidência.

Aí apelaram aos militares, para implantar sua civilização ao resto do país, a ferro e fogo. Foi o governo por excelência dessa elite. Paz sem povo – como o Serra prometia no campo: paz sem o MST.

Veio a redemocratização e essa direita se travestiu de neoliberal, de apologista da civilização do mercado, aquela em que, quem tem dinheiro tem acesso a bens, quem não tem, fica excluído. O reino do direito contra os direitos para todos.

Essa elite paulista nunca digeriu Getúlio, os direitos dos trabalhadores e seus sindicatos, se considerava a locomotiva do país, que arrastava vagões preguiçosos – como era a ideologia de 1932. Os trabalhadores nordestinos, expulsados dos seus estados pelo domínio dos latifundiários e dos coronéis, foi para construir a riqueza de São Paulo. Humilhados e ofendidos, aqueles “cabeças chatas” foram os heróis do progresso da industrialização paulista. Mas foram sempre discriminados, ridicularizados, excluídos, marginalizados.

Essa “raça” inferior a que aludiu Jorge Bornhausen, são os pobres, os negros, os nordestinos, os indígenas, como na Europa “civilizada” são os trabalhadores imigrantes. Massa que quando fica subordinada a eles, é explorada brutalmente, tornava invisível socialmente.

Mas quando se revela, elege e reelege seus lideres, se liberta dos coronéis, conquista direitos, com o avança da democratização – ai são diabolizadas, espezinhadas, tornadas culpadas pela derrota das elites brancas. Como agora, quando a candidatura da elite supostamente civilizada apelou para as explorações mais obscurantistas, para tentar recuperar o governo, que o povo tomou das suas mãos e entregou para lideres populares.

É que eles são a barbárie. São os que chegaram a estas terras jorrando sangue mediante a exploração das nossas riquezas, a escravidão e o extermínio das populações indígenas. Civilizados são os que governam para todos, que buscam convencer as pessoas com argumentos e propostas, que garantem os direitos de todos, que praticam a democracia. São os que estão construindo uma democracia com alma social – que o Brasil nunca tinha tido nas mãos desses supostos defensores da civilização.

sábado, 6 de novembro de 2010

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Inverdades e desinformação no debate que querem esconder

DEBATE ABERTO

Regulação em debate: sobre inverdades e desinformação

A grande mídia e seus aliados, ao satanizarem a iniciativa cearense, tentam, ainda uma vez mais, evitar a prática democrática legítima da cidadania que participa diretamente na gestão da coisa pública e defende seus interesses, prevista na Constituição de 1988.
Artigo publicado originalmente no Observatório da Imprensa

A aprovação, no último 19 de outubro, do Projeto de Indicação nº 72.10, que propõe a criação do Conselho Estadual de Comunicação Social (CECS) pela Assembléia Legislativa do Ceará (e que ainda depende da sanção do governador do estado), detonou o último ciclo de inverdades e desinformação relativas às liberdades de expressão e de imprensa no país.
Nos últimos meses, esta tem sido a estratégia da grande mídia e de seus aliados – desta vez, inclusive, a OAB nacional – que, sem divulgar texto e/ou discutir o mérito das propostas, trata de satanizar qualquer tentativa do Estado e da cidadania de exercer seu direito de cobrar dos concessionários do serviço público de radiodifusão o simples cumprimento de normas e princípios já inscritos na Constituição de 1988.

Origem

Ao contrário do que se alardeia, os Conselhos de Comunicação não são uma invenção da 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom). A idéia surgiu formalmente em encontro nacional de jornalistas promovido pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), com o objetivo de discutir propostas a serem apresentadas no processo constituinte, em 1986. Lá se vão, portanto, mais de 24 anos.
Posteriormente, a idéia fez parte de Emenda Popular apresentada ao Congresso Constituinte, subscrita, além da Fenaj, pela Central Única dos Trabalhadores, pela Central Geral dos Trabalhadores, pela Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior, pela Federação das Associações de Servidores das Universidades do Brasil, pela União Nacional dos Estudantes, pela Federação Brasileira de Trabalhadores em Telecomunicações, pela Associação dos Empregados da Embratel, pela Federação Nacional dos Engenheiros, pela Federação Nacional dos Arquitetos e pela Federação Nacional dos Médicos. Além disso, assinaram a Emenda Popular os então líderes do PT Luiz Inácio Lula da Silva; do PDT, Brandão Monteiro; do PCB, Roberto Freire; do PC do B, Haroldo Lima, e do PSB, Beth Azize (ver depoimento do ex-presidente da Fenaj, Armando Rollemberg ao Conselho de Comunicação Social, disponível aqui).
A proposta original – que tinha como modelo a Federal Communications Commission (FCC) americana – foi objeto de controvérsia ao longo de todo o processo constituinte e acabou reduzida à versão finalmente aprovada como artigo 224 da Constituição, que diz:
Art. 224. Para os efeitos do disposto neste capítulo [Capítulo V, "Da Comunicação Social", do Título VIII "Da Ordem Social"], o Congresso Nacional instituirá, como seu órgão auxiliar, o Conselho de Comunicação Social, na forma da lei.
Em 30 de dezembro de 1991, o então presidente Fernando Collor sancionou a lei nº 8389, cujo projeto original foi de autoria do jornalista, professor e senador Pompeu de Souza (PMDB-DF), já falecido, que instituiu o Conselho de Comunicação Social (CCS).
Apesar disso, resistências articuladas pelos mesmos interesses que ainda hoje se opõem à iniciativa fizeram que sua instalação fosse postergada por mais de onze anos, até 2002. Instalado, o CCS funcionou durante quatro anos e desde dezembro de 2006 não mais se reuniu (ver, neste Observatório, “Por que o CCS não será reinstalado”, “Senado descumpre a Lei” e “Três anos de ilegalidade”).

Conselhos municipais e estaduais

Desde que a Constituição de 1988 foi promulgada, várias iniciativas de criação de conselhos semelhantes ao CCS surgiram tanto em nível municipal como estadual. O primeiro Conselho Municipal de Comunicação (CMC) foi criado na Prefeitura Municipal de Porto Alegre por meio do decreto nº 9426, assinado pelo então prefeito Olívio Dutra, em 5 de maio de 1989.
Uma pesquisa realizada pelo Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), em 2009, indica que também a cidade de Goiânia (GO) chegou a ter um CMC instalado. Juiz de Fora (MG) e Anápolis (GO) prevêem a criação destes conselhos.
Em nível estadual, algumas constituições ou leis orgânicas contemplam a criação dos Conselhos Estaduais de Comunicação Social (CECS). É o caso de Minas Gerais, Bahia, Alagoas, Paraíba, Pará, Amapá, Amazonas e Goiás. No estado do Rio de Janeiro existe uma lei que trata do assunto (lei nº 4.849/2006) e, em São Paulo, o decreto nº 42.209, de 15 de setembro de 1997, também prevê a criação de um CECS (ver “Conselhos de Comunicação são ignorados”, revista MídiaComDemocracia, pág. 8).
No Distrito Federal, a Lei Orgânica aprovada em 8 de junho de 1993 prevê:
Art. 261. O Poder Público manterá o Conselho de Comunicação Social do Distrito Federal, integrado por representantes de entidades da sociedade civil e órgãos governamentais vinculados ao Poder Executivo, conforme previsto em legislação complementar.
Parágrafo único. O Conselho de Comunicação Social do Distrito Federal dará assessoramento ao Poder Executivo na formulação e acompanhamento da política regional de comunicação social.
Na campanha eleitoral de 1994, por iniciativa do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Distrito Federal, o assunto foi discutido em debate com os candidatos a governador e todos se comprometeram a cumprir o que já constava da Lei Orgânica. O candidato Cristóvam Buarque, depois governador (1995-1998), comprometeu-se, se eleito, a enviar projeto neste sentido à Câmara Distrital em até 90 dias após sua posse. O projeto não foi enviado e, até hoje, não existe CECS no Distrito Federal.
Em resumo: apesar de estar na Constituição da República e em várias constituições e leis orgânicas estaduais e municipais, não existe um único Conselho de Comunicação funcionando no país.
Por que será?

Prática democrática

Como se pode constatar, a idéia dos Conselhos de Comunicação não surgiu na 1ª Confecom e a iniciativa cearense não é sequer a primeira. Trata-se de norma constitucional.
Para não tornar este artigo demasiadamente longo, omito a transcrição do texto da Lei nº 8389/1991, que institui o Conselho de Comunicação Social previsto no artigo 224 da Constituição, e do Projeto de Indicação nº 72.10, aprovado pela Assembléia Legislativa do Ceará. Convido, no entanto, o eventual leitor(a) a comparar os dois textos com o capítulo “Da Comunicação Social” da Constituição de 1988.
Quem se der ao trabalho verá que a grande mídia e seus aliados, ao satanizarem a iniciativa cearense, tentam, ainda uma vez mais, evitar a prática democrática legítima da cidadania que participa diretamente na gestão da coisa pública e defende seus interesses, prevista na Constituição de 1988. No caso, interesses em relação aos concessionários do serviço público de radiodifusão.
Nada mais, nada menos do que isso.

(*) Venício A. de Lima é professor titular de Ciência Política e Comunicação da UnB (aposentado) e autor, dentre outros, de Liberdade de Expressão vs. Liberdade de Imprensa – Direito à Comunicação e Democracia, Publisher, 2010.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

Opinião discordante: The War on Democracy 2007 legendado

Assista e tire suas próprias conclusões!



Outros vídeos e textos de interesse em nosso Espaço Cultura

Vermelho: Discurso de Serra aliou deselegância e ressentimento

O discurso do candidato derrotado no domingo inovou: tardou para reconhecer a vitória de Dilma Rousseff e foi, numa hora imprópria, um canto de guerra contra a nova presidenta.

Por José Carlos Ruy (*)

Deselegância e ressentimento – estas foram as marcas da reação tucana à derrota eleitoral do dia de ontem, 31 de outubro. O grande cardeal peessedebista Fernando Henrique Cardoso respondeu aos acenos conciliatórios da nova presidenta Dilma Rousseff dizendo que as “pontes foram queimadas” entre seu partido e o PT. E foi petulante quando, referindo-se aos oito anos do governo Lula, reclamou por não ter sido consultado sobre questões nacionais, numa clara demonstração da pretensão descabida que manteve de monitorar seu sucessor e influir em seu governo!

A mais forte manifestação de deselegância e ressentimento foi dada, no entanto, pelo candidato derrotado José Serra. Ele não seguiu a tradição de reconhecer publicamente a derrota antes do discurso da vencedora – Serra falou, em seu comitê de campanha, em São Paulo, aos escassos correligionários que lá estavam, depois do emocionado e afirmativo discurso de Dilma Rousseff, a quem formalmente desejou no exercício da Presidência a partir do dia 1º de janeiro de 2011.

O discurso de Serra misturou o agradecimento aos que votaram nele, a gratidão à militância tucana, o desapontamento pela derrota e a proclamação da guerra aberta contra o governo de Dilma Rousseff, desmentindo todas as proclamações pela unidade dos brasileiros que os tucanos fizeram durante a campanha eleitoral. Eles levantaram contra Lula, Dilma, e as forças democráticas e populares a acusação falsa de dividirem o país. Mas o discurso de Serra e as reações de outros dirigentes tucanos trouxeram embutidos, eles sim, a cizânia e a pregação de um confronto que extrapola as disputas eleitorais.

Serra tem o direito de alimentar pretensões políticas. Sinalizou isso ao dizer “quis o povo que não fosse agora”, insinuando-se desde já como candidato para 2014. Ou quando se despediu com um “até logo” e não um mero adeus. Um político de seu porte e projeção não poderia fazer diferente.

O que causou estranheza em seu discurso foi o tom bélico e agressivo com que anunciou sua disposição futura. “Nós apenas estamos começando uma luta de verdade” para dar “dar a nossa contribuição ao país, em defesa da pátria, da liberdade e da democracia”, disse. Lembrou Jânio Quadros quando se referiu a “forças terríveis” enfrentadas nos meses “duríssimos” da campanha eleitoral, contra as quais vocês “formaram uma grande trincheira, construíram uma fortaleza e consolidaram um campo político de defesa da liberdade, da democracia e das grandes causas econômicas no Brasil”. E terminou com um “a luta continua”.

Serra demonstra a vontade de comandar uma oposição ao governo de Dilma Rousseff vestida com os mesmos trajes guerreiros usados durante a campanha de mentiras e calúnias da disputa eleitoral. Resta saber se terá meios para isso com a perda de força da direita nesta eleição. O DEM sai profundamente enfraquecido; o PPS com a perspectiva de liquidação enquanto força política independente e anexação a um PSDB rachado de alto a baixo e sem outro nome de expressão nacional além do ex-governador mineiro Aécio Neves, um inimigo íntimo de José Serra.

São partidos cuja força declina a nível nacional e que se acomodam, agora, à uma expressão estadual e mesmo municipal. Nem se diga, como repetem os jornalões neste day after eleitoral, que o PSDB vai governar mais da metade do eleitorado brasileiro, um argumento que serve mais de consolo para a derrota do que para compor um retrato efetivo do comportamento do eleitorado. Primeiro porque são estados onde, mesmo naqueles em que ficou atrás de Serra, Dilma teve expressiva votação. Os estados, aliás, não são feudos ou currais eleitorais controlados por seus dirigentes! Depois, porque nenhum deles será governado por figuras cuja influência extrapole seus limites locais e tenham forte expressão nacional: a direita está carente de figuras desta dimensão.

Além disso, como ficou cristalino ao longo da campanha eleitoral, a direita neoliberal não tem um projeto de nação que possa ostentar abertamente. Seu programa é a surrada ladainha neoliberal, privatizante e antinacional, rejeitada nas urnas depois de infelicitar a nação nos oito anos em que estiveram à frente do governo, com Fernando Henrique Cardoso.

A perspectiva que se abre para a oposição neoliberal é um rearranjo de forças e uma reorganização de suas lideranças. Esta talvez seja outra leitura possível do discurso de Serra – a pretensão de se capacitar para permanecer no comando de uma oposição que ameaça girar no vazio de lideranças nacionais. Não será uma tarefa fácil para José Serra dada a coleção de desafetos que seu estilo reconhecidamente desagregador acumulou mesmo entre aqueles que, no período eleitoral, estiveram a seu lado.

(*) Jornalista, membro do Comitê Central do Partido Comunista do Brasil,  editor do jornal A Classe Operária.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

A festa da democracia brasileira

Uma parcela da população, baseada numa mídia “denunciadora”, está convencida que “todos os políticos são corruptos” e pouco importa votar. A corrupção da democracia seria uma doença brasileira. Mas, se tivermos em mente o funcionamento da democracia norte-americana, veremos que no Brasil muito mais pessoas acreditam na democracia.

O Brasil votou! São quase 135 milhões de pessoas utilizando de uma tecnologia ultramoderna, que gera rapidez e segurança na apuração. A divulgação dos resultados é rápida, impedindo riscos e nervosismo. Estamos assim, ao lado da índia e dos Estados Unidos – malgrado diferenças – como uma das maiores democracias do mundo. Chegamos ao dia definitivo das escolhas nacionais com calma, sem ameaças ou conflitos.

A maioria do país trabalha como de costume, preocupada com o virtual empate na liderança do campeonato brasileiro ou com mais uma sucessão de crimes violentos. Enquanto isso faz uma pausa para votar de forma ordeira e participativa. Mas, uma parcela da opinião pública – e da mídia - declara a democracia no Brasil em risco. Alguns dos acontecimentos em torno do processo eleitoral, como publicado nos grandes jornais, talvez dêem a impressão que vamos mal na gestão da nossa democracia.

Escândalos sobre dossiês, nepotismo, financiamento irregular de campanha e uso do poder econômico e desvios de recursos de obras públicas são noticiados todos os dias na mídia.

Além disso, passado o primeiro turno, os resultados nas eleições dos parlamentos estaduais e nacional deixou, para esta parcela alarmada da opinião pública, um sabor amargo. Alguns políticos de “ficha suja” conseguiram, por tibieza da Justiça, ou através de “laranjas eleitorais” driblarem o esforço para torná-los inelegíveis. Pior ainda: figuras (supostas) tremendamente desqualificadas para o exercício da representação popular, desde um palhaço televisivo até craques de futebol foram eleitos para o parlamento. Muitos lamentam e buscam, fora do processo eleitoral – em especial em instâncias técnicas, como os tribunais -, soluções ousadas para “purificar” a democracia brasileira. No fundo, há uma crença que afirma a imperiosidade de guiar o voto popular, já que o povo por si só não saberia votar.

Outros, simplesmente dão de ombros e declaram que não participarão “desta farsa” e declaram voto nulo. Mesmo a “novidade” do processo eleitoral, a candidata verde, do alto de seus vinte milhões de votos, declara que “todos são iguais” e não propõe qualquer compromisso e nem mesmo orienta seu próprio eleitorado.

Em suma, pretende-se uma pureza vestal perante uma democracia que não seria suficientemente boa para almas tão limpas.

Os pecados da democracia brasileira
Para estes novos “cátaros” – os puros! - teríamos, depois do restabelecimento pleno da democracia no Brasil, digamos em 1988 com a vigência da nova constituição (dita “cidadã”), esbarrado em obstáculos terríveis que viciariam o exercício democrático no país.

Uma parcela da população, baseada numa mídia “denunciadora”, esta convencida que “todos os políticos são corruptos” e pouco importa votar. A corrupção da democracia seria uma típica doença brasileira. Mas, se tivermos em mente – só para efeito de comparação – o funcionamento da democracia norte-americana, veremos que no Brasil muito mais pessoas acreditam na democracia do que na América. Um poderoso movimento como o “Tea Party”, de caráter conservador e capaz de mobilizar multidões de americanos, acredita piamente que Washington é um centro de corrupção incurável, os políticos são ladrões e talvez uma entidade internacional maligna domine o Congresso e a Presidencia da República (possivelmente de origem “judaica”, ecoando um nítido racismo anti-semita). No Brasil muitos acreditam que o país vive num “mar de lama”, onde todos os políticos são corruptos. Bem, se nos propusermos a uma comparação, como por exemplo, na França (uma democracia consolidada), onde presidente – com baixíssimos índices de popularidade – é acusado de “vender” cargos de governo para uma milionária e trocar financiamento de campanha por perdão fiscal, teremos dificuldade em achar uma “DNA” da corrupção brasileira”. Nos Estados Unidos a cadeira de senador de Obama foi colocada “à venda” por seu partido. No Japão, na Espanha e na Alemanha - o ruidoso caso Kohl, onde o primeiro-ministro da unificação alemão apoderou-se de fiundos oriundos da privatização da antiga Alemanha oriental – escândalos similares também ocorrem. Ou seja, nas grandes democracias a corrupção é um problema constante. Não há como negar. Mas, não é fenomenos “brasileiro”!

Rinocerontes & Macacos: limites da democracia?
Mesmo assim, alguns brasileiros não acreditam na democracia brasileira porque “os políticos não estão preparados”. Elegemos o rinoceronte “Cacareco” em São Paulo (eleito vereador da cidade me 1958), ou Macaco Tião no Rio de Janeiro (em 1988) e, desta feita, um palhaço da televisão. Pois é, mais uma vez a comparação se impõe: a Itália elegeu ainda recentemente uma atriz pornô (eleitas pelo Partido Radical em 1987); a França um palhaço que se travestia de penas foi candidato a presidente em 1980... Nas atuais eleições parlamentares e municipais dos EUA uma cafetina é candidata a prefeitura de Nova York... E daí? Seria isso prova suficiente que precisamos de um curso de obrigatório para ser político (depois da passagem pelo exame de “ficha limpa”), para termos bons políticos? Duvido. O maior presidente dos EUA (ao menos para eles) foi um ator canastrão de Hollywood chamado Ronald Reagan. Aliás, o governador da Califórnia é um ator/fortão cujo melhor desempenho fílmico consistia em apenas uma frase: “Hasta la vista, baby!”. Por que então um bom jogador de futebol, um ator, um jornalista da TV não serão, a priori, bons congressistas? O Congresso Nacional é uma síntese da população brasileira. Assim, são bem-vindos todos os representantes e setores da população brasileira. O pouco representativo congresso de bacharéis da República Velha (1889-1930), uma elite muito instruída, falante de francês e capaz de um leguleio de horas, não aprecem ser um paradigma de representatividade. Contudo era culto!

A nossa democracia e democracia dos outros!
Mas, e o palhaço televisivo? Isso sim é sério. Ao contrário do Macaco Tião ou do Rinoceronte Cacareco, o palhaço toma posse e exerce o mandato. Isso seria uma prova da fragilidade da democracia brasileira! Ainda creio que não. É, muito possivelmente, uma prova de que nem todos os brasileiros acreditam na democracia. Isso é um índice histórico, normal, que deve ser encarado sem traumas. Nem todos os brasileiros acreditam na democracia, ou querem votar ou se interessam pela vida política do país. Os índices de abstenção nos Estados Unidos e na Inglaterra, países em que o voto não é obrigatório, são historicamente altos. Os maiores índices de participação eleitoral norte-americana (Kennedy e Obama) estiveram em apenas 64% da população! Nós optamos por uma democracia compulsória, obrigando todos a votarem, baixando a idade do voto e ampliando-a aos analfabetos. E ao mesmo tempo negamos a possibilidade de uma reforma política ou sequer o debate sobre3 o voto distrital ou misto. Ora, quem não acredita na democracia como sistema de escolha de governantes opta por fazer uma piada, um protesto ou simplesmente embaçar a vida dos que acreditam na democracia. Devemos aceitar este fato, isso também seria democrático: acreditar que existe uma parcela da população que não acredita na democracia e não quer votar. Ou que o sistema proporcional de votos não compromete o eleitor com seu próprio voto e com o seu eleito!

Daí a imperiosidade de se debater a reforma política no Brasil.

Uma democracia em funcionamento:

A eleição do sucessor de Lula da Silva completa um quadro de continuidade raro, na verdade raríssimo, na história da República do Brasil. Somente no apogeu da República Velha, entre os governos de Prudente de Morais (1894) e Washington Luis (1926) conseguimos uma sucessão pacífica de uma seqüência tão grande de presidentes. Na Nova República conseguimos a sucessão de Sarney, Collor/Itamar, FHC (duas vezes) e Lula (duas vezes). Na República Velha deu-se uma seqüência maior de sucessões, contudo estava tal sucessão sedimentada no voto de cabresto, na comissão de credenciais (dita “da degola” da oposição, quando o congresso, majoritariamente governista recusa diplomar os eleitos pela oposição – na época nação havia Justiça Eleitoral no país, criada somente no Governo José Linhares, em 1945), e na vigência de Estado de Sítio em 1897, 1904, em 1914 e em 1924. Dezenas de revoltas, pequenas e grandes, pontilharam o cenário da “República das Carcomidos”. Guerras sociais brutais, como Canudos, em 1896,e Contestado, entre 1912 e 1916, além de bombardeios contra civis em capitais como Salvador, em 1912, e Niterói, em 1894, não foram fatos isolados.

Em contraponto, tivemos depois de 1988 sucessões embasadas na lei e na vontade popular. A ascensão de Sarney – no boja da tragédia de Tancredo Neves - foi balizada pela lei. O Impedimento de Collor (precedido dos Escândalos do Orçamento) foi resolvido na lei. A emenda constitucional que instituiu a reeleição foi feita de forma constitucional – mesmo que tenha sido através de um amplo mercadejar no congresso nacional. Além disso, a imprensa funciona livremente no país, ora vítima de excesso de zelo (mormente do Judiciário, que é generoso em declarar segredo de Justiça em dezenas de casos), ora ela mesmo exagerando na pressa de divulgar casos e notícias sem qualquer cuidado (Caso da Escola Base, Caso Ibsen Pinheiro, etc... ). O Judiciário é independente, bem como na prática o são também instituições estruturadoras da República como o Ministério Público, BC (e nem sempre na melhor direção!) e a PF.

Estamos longe da crise de 2001 nos Estados Unidos, quando o candidato mais votado pelo povo – Al Gore – perdeu a presidência no tapetão dos casuísmos e decisões marotas da Justiça, em especial do Estado da Flórida.

Ainda insatisfeitos?
Mesmo assim estamos insatisfeitos? Ok, mas, temos algo melhor para colocar no lugar de tais instituições? As tentativas de invenção política ou de engenharia institucional do século XX mostram os tremendos riscos nesta direção. Hoje existe no país uma consciência coletiva de que a democracia, apesar de seus muitos vícios, é a melhor opção de gestão da coisa pública. Ok, tem quem discorde disso. Proclame riscos imensos. O fantasma da máquina pública (e isso só no caso da eleição presidencial, no caso, por exemplo, da poderosa máquina do Estado de São Paulo faz-se o silêncio).

Há ainda outra acusação: o presidente “apequenou” a presidência fazendo campanha político. Ora, o presidente é um político, por isso faz política. E isso ocorre em todo o mundo. Neste momento mesmo, Obama deixa Washington (e isso sem conseguir acabar com as guerras americanas ou gerar empregos no país) e viaja o país, de ponta a ponta, para eleger deputados pelo Partido Democrata. No limite, Obama abandonou a questão palestina para não contrariar o voto judaico na véspera das eleições americanas!

Na verdade, no Brasil (ou nos EUA) o presidente é chefe de estado e chefe de governo, assim as funções política estão sobrepostas e são legítimas. Foi assim, por exemplo, com Michelle Bachelet, na última eleição chilena (e perdeu) ou com Uribe, na última eleição colombiana (e ganhou). Só não foi assim com FHC, posto que ao fim de seu governo contasse com menos de 23% de aprovação popular! Ao contrário, Bachelet, Uribe ou Lula – todos com mais de 80% de aprovação – como políticos e chefes de governo (ao lado da chefia do estrado) tem o direito de propor a apoiar os seus partidos na luta pela sucessão.

Isso se chama jogo democrático.

E aí?

Temos problemas? Claro que sim! Do ponto de vista institucional a fragilidade dos partidos políticos é notória (incluindo aí a esperteza de trazer um palhaço televisivo para dentro de um partido). Também é ruim a amplitude das coalizões partidárias, onde partidos menores, conservadores e oligárquicos, tentam pautar os grandes partidos de massas. Também é muito ruim, ruim mesmo, a “judicialização” da política brasileira. É um erro recorrer aos tribunais – quando os tribunais nem mesmo conseguem decidir a coisa política – sobre todos os temas. É ruim tentar anular candidaturas e imputar crimes a candidatos populares, visando ganhar eleições no tapetão do Judiciário. Também é um risco para a democracia a emergência de fundamentalismo religioso na política, que confunde a esfera privada – da família, da empresa, das igrejas – com a esfera pública, necessariamente laica e agnóstica. É um tremendo risco que alguns homens, escondidos sob suas batinas negras, chamem chefes de estado estrangeiros para interferir na política e na escolha do povo brasileiro.

Com tudo isso a democracia brasileira é hoje forte e permite o melhor arranjo de administração de um país imenso e desigual como Brasil.

Viva a festa da democracia brasileira.

(*) Francisco Carlos Teixeira é professor Titular de História Moderna e Contemporânea da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).